Mercado dinâmico e avanço da hipercompetição não permite mais ficar preso a apenas poucas fontes de receita. Revisão de portfólio e carteira de clientes emerge como tarefa fundamental. Matéria de CRN
O mundo dos negócios gira em espirais cada vez mais velozes. A história recente demonstra grandes transformações. O modelo simples de competição ganhou diferentes contornos e intensidade, exigindo transformações constantes dos negócios na proporção que os ciclos de vida das organizações sofrem uma nova dinâmica. O contexto pede, entre outras coisas, análise detalhada e constante de seu portfólio e de sua carteira de clientes como forma de fugir de cenários de dependência e consequentemente mitigar riscos. Diversificar fontes de receita emerge como algo primordial na perpetuação de uma companhia.
Muitas vezes, um fornecedor de TI não percebe que está dependente de um cliente ou fabricante. Começa com um projeto pequeno e tudo vai bem. Novas oportunidades surgem e abrem-se portas para novos negócios. Ótimo. Os olhos se arregalam e quer se abraçar o mundo. Em alguns casos, o empresário não vê que aquilo implica em comprometer uma capacidade de recursos que não possui. “Ao invés de ser uma solução para ganhar mais dinheiro, vira um problema de abastecimento e cumprimento de prazos onde padrões de qualidade podem não estar sendo atendidos”, aponta o consultor do Sebrae-SP, Reinaldo Messias, para acrescentar: “A oportunidade tentadora transforma-se em um enorme problema”.
“Não se pode ser dependente de um único produto, cliente ou fornecedor”, pontua Mariano Gordinho, presidente da Abradisti (Associação Brasileira dos Distribuidores de Tecnologia da Informação). Qualquer desvio de comportamento em um desses três elos gera um desequilíbrio sistemático, uma vez que as coisas atuam interconectadas. Pelo lado de oferta, obviamente, grandes marcas abocanham fatias significativas como fontes de receitas em negócio. “O que debatemos, é que uma marca top tem que representar menos de 50% da receita de um distribuidor, acima disso, a zona de risco é fácil de ser identificada, pois qualquer erro estratégico do fabricante tem uma implicação instantânea sobre grande parte do teu faturamento”, comenta. Existem alguns exemplos recentes nesse sentido no mercado brasileiro com o desabastecimento de produtos Cisco ocasionado a partir da Operação Persona.
Pelo lado da demanda, a representatividade de um cliente em sua receita deve ser bem mais baixa do que o que você tem atrelado a um fornecedor. Alguns especialistas apontam para um patamar máximo de dependência de faturamento em uma única fonte entre 10 e 20%. A equação de Messias define não comprometer mais de 50% de sua capacidade de entrega nem atrelar mais de 30% de seu faturamento à apenas um freguês. Esses números farão com que, no mínimo, você tenha tempo de sair por aí em busca de novas fontes de renda.
Comprometer grande parte da capacidade de entrega em apenas uma fonte de faturamento acaba fazendo com que aquele cliente sinta-se dono do seu negócio. “Isso é ruim porque a pressão acaba sendo muito forte para os dois lados”, comenta o consultor. “Mesmo que você seja um fornecedor exclusivo, lembre-se que ninguém gosta de ficar refém”, diz o especialista, deixando claro o que é sabido por muitos: seu cliente sempre trabalha com uma alternativa para repor uma quebra de abastecimento. Jogue o mesmo jogo, afinal pulverizar as origens de receita, em último caso, evitará transtornos.
Além disso, existe a tentação de atender uma grande conta. Isso traz glamour e visibilidade. Na outra ponta surge um desafio de entrega e dependência que traz consigo alguns riscos embutidos de uma eventual dependência econômica daquela conta que engole fatias imensas da pizza de seu faturamento mensal. O cenário bom por um lado e um risco por outro. Procure olhar sempre além daquilo que você está fazendo. Não é que um cliente grande é ruim, afinal, alguns gigantes valem por 50 pequenos, pois tem diversas áreas passíveis de ser atendidas. Mas, ficar lá dentro só com uma atividade o deixará comprometido. Concentrar grande parte dos ganhos da companhia em apenas um cliente ou negócio pode ligar o sinal de alerta. Há um ditado muito repetido por executivos norte-americanos: não se deve colocar todos os ovos na mesma cesta. Afinal, se ela for ao chão, muitos quebrarão.
Carlos Alberto Sacco, diretor de marketing da Abes (Associação Brasileira das Empresas de Software), recorda do caso de um amigo que, na época em que os mainframes dominavam o ambiente computacional corporativo, tinha uma empresa 100% vinculada à prestação do serviço de processamento da folha de pagamento de 10 mil funcionários para apenas uma companhia. O mercado passou por um downsizing. “Quando o cliente migrou da plataforma alta para o modelo distribuído, a empresa quebrou. O cara não se preparou para que pudesse antever esse problema ou mesmo desenvolver uma solução para o novo ambiente”, estabelece.
Caminho
Quando fundou a BRQ, diversificar as fontes de receita já figurava entre as preocupações de Benjamin Quadros. No início dos anos 90, deixou o posto de funcionário para virar fornecedor de serviço de desenvolvimento de software ao Unibanco (hoje Itaú/Unibanco). O técnico virava empreendedor sem ter a visão clara de que sua empresa se tornaria em uma das maiores companhias nacionais de TI. Contudo, quando viu que aquilo era um negócio, percebeu que depender de um único cliente poderia significar eventuais dores de cabeça.
Durante os três primeiros anos, os negócios da companhia concentraram-se apenas no banco, que era uma das maiores instituições financeiras do País a época, e trazia consigo o desafio da entrega para a novata. O gigante consumiu muitos dos recursos de produção da fornecedora. Tanto que outros bancos batiam à porta da BRQ querendo um pouco do que ela entregava ao Unibanco. “A qualidade era divulgada boca a boca, isso gerava demanda superior a capacidade”, recorda o presidente. Enquanto aproveitava a visibilidade que aquele projeto lhe dava, crescia internamente dentro do cliente único.
Na medida em que a capacidade de entrega crescia, novas contas eram absorvidas, e a participação do cliente caiu dentro do faturamento da fornecedora. “Até hoje focamos bastante em diversificação. Crescer implica em abrir novas portas. A concentração de receita é desconforto também para o cliente”, avalia Benjamin. Ao longo dos anos, a fornecedora seguiu uma cartilha de pulverização de receitas que contemplou, ainda, abertura de escritórios em outros estados e compra de empresas. Atualmente, o cliente mais expressivo dentro do faturamento da empresa responde por menos de 10% dos 330 milhões de reais verificados em 2011.
Só que o processo de diversificação não é simples. Nos anos 80, a Scopus estabeleceu-se como um dos principais players brasileiros de tecnologia apoiada na fabricação de computadores. No final daquela década, o Bradesco assumiu o controle acionário da companhia, transformando-se em uma espécie de departamento do banco. Em meados dos anos 90, a empresa partiu para um processo de reestruturação abrindo-se para o mercado. “Se olharmos há um tempo muito distante, éramos muito vinculados ao controlador e a um único contrato. Isso não existe mais”, comenta Mauro Cremm, superintendente-executivo da fornecedora, explicando que o que era um grande contrato de terceirização de telecomunicações e assistência técnica ganhou terreno dentro do Grupo.
Ainda hoje as receitas da companhia encontram-se muito ligadas a instituição financeira. Contudo, há uma orientação clara para fazer esse cenário mudar. O objetivo atualmente reside em aumentar participação de mercado sem deixar a concorrência atender o Bradesco que, afinal, investe uma quantia superior a 3 bilhões de reais em TI por ano. O expectativa é ver os negócios fora do controlador crescerem 35% ao longo de 2012 – ano em que a projeção de expansão geral da companhia aponta para uma taxa de 20% –, com foco nas verticais de finanças, telecom e fabricantes de tecnologia. A Scopus já percorreu um bom caminho ao longo desde que se propôs a ampliar sua atuação, contabilizando cerca de 100 clientes em sua carteira. Atualmente, a empresa está estruturada em duas grandes áreas: soluções, que desenvolve aplicações seguras e integradas para negócios online; e serviços, que está voltada à infraestrutura de TI das empresas.
Analisar a matriz de negócios muitos vezes traz algumas armadilhas quando concentração das receitas não encontra-se em um único cliente, mas em uma base de empresas de um mesmo setor, por exemplo com 80% de suas receitas ligadas a 10% de sua base. “O perigo, nesse caso, fica mais imperceptível pela pulverização. Se uma movimentação de mercado ou do setor pode forçar uma saída do mercado – com um único cliente, a dimensão do risco fica mais clara”, comenta Luis Augusto Lobão, professor da FDC.
Depender de um mercado concentrado é perigoso por expor a um cenário externo que extrapola em muitos pontos seu controle da situação. Ter uma companhia focada em mercados verticais pode ser uma estratégia certeira, mas tenha cuidado, pois muitas vezes a situação esconde um risco sistêmico. Pense se a especialidade dessa empresa seria atender clientes do setor de crédito imobiliário norte-americano há cerca de quatro anos. Independente de atender uma base grande de usuários, quando o mercado entrou em colapso devido ao subprime, sua estrutura, no mínimo sofreu algumas rachaduras. Monitorar as receitas em relação ao esforço da entrega e ponderar o risco da perda daquela receita no curto e médio prazo. Esse monitoramento pode ser fundamental. Mais: instabilidades e incertezas macroeconômicas levam companhias – seus clientes, no caso – em busca de novos e mais vantajosos contratos.
Engajamento
Parte do processo de amadurecimento pressupõe que os líderes de uma organização assumam a responsabilidade de buscar alternativas para perpetuação da empresa. É preciso conciliar a paixão pelo lucro tanto quanto pelo crescimento. A ideia básica consiste em preparar o setor e sistema de negócios como forma de que ao primeiro sinal de fragilidade em uma frente permita com que se consiga identificar novas oportunidades. O especialista em gestão defende a importância de que os executivos comecem a maturar – antes que seja necessário – oportunidades adjacentes e novas plataformas de negócio, o que significam novos clientes, nichos, canais e soluções.
“Pensar em novos clientes e tecnologias significa buscar novas plataformas de negócio ou adjacências”, comenta. A diferença entre os dois conceitos trazidos pelo especialista referem-se a distância em relação ao core business da organização. “Ambas são oportunidades”, ressalta. “Somente empresas excepcionais conseguem trabalhar as adjacências antes que seja necessário, pois isso significa perceber e maturar novidades, muitas vezes, no momento em que seu negócio passa pela fase de crescimento”, pontua. Dosar o esforço para pensar o novo é fundamental. “Outro elemento é que sofremos uma total desfronteirização dos setores”, sinaliza Lobão, indicando que não há mais limite para a concorrência em âmbito territorial quanto por indústria.
Notícia de: http: //migre.me/7VSp3